Nina Simone - Spring is here

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

nua e crua

A melhor forma de amar é nua. Despida de escudos, armas, artifícios, medos, inseguranças ou receios.
A melhor forma de amor é amar e ser amado em nudez.
É raro, mas é possível encontrar um amor assim. Um amor que não precisa de roupas para aconchegar o coração. Nem capas para o proteger.
Pois a melhor forma de amar é assim: nua e crua.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Infinito

Que a covardia não me amarre os braços, não me trave a língua, não me faça engolir os beijos que estão pousados nos meus lábios. Que a covardia não me vende os olhos, não espalhe monstros, não me sussurre medos. Que a covardia não me descubra pequena e frágil numa caixa de segredos. Que a covardia não me pregue peças, não me tire o nome, não me mate de fome à beira da mesa posta. Que a covardia não encrave as frases na garganta. Que eu seja forte e alta, que eu descubra asas e que ouse usá-las. Que eu esqueça os fundos, os absurdos, os (des) mundos e faça de mim mesma a flor na água, a prece clara, o céu limpo.
Que eu seja capaz de querer alcançar o infinito.

E um dia esquece-se

E há, então, um lugar para onde vão os sonhos em que deixamos de acreditar, onde moram os anéis que perdemos, os brincos sem par, as meias descasadas, o baton que a bolsa engoliu.
Há um lugar, um sumidouro, para onde são tragados os sorrisos que não voltam, o cheiro do cabelo, um colarinho manchado, o perfume na manga do vestido, o nome dele num bilhete, um gosto de vinho colado à língua.
Ficam lá, suspensos numa órbita improvável e inacessível, ao som de três ou quatro frases para sempre repetidas, que procuramos esquecer. E um dia esquecemos.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Olhos esquecidos

Esqueço teus olhos. Esqueço tua pele. Esqueço o cheiro que só existe em certas partes do teu corpo. Esqueço-me de mim também, e muito. Morro, por vezes. Então escrevo para contar àquela de mim do que me compus. E escrevo de novo para lembrar a ti do que me fizeste.

É estranho que o mundo silencie, breve e triste, e que na minha boca fechada as palavras batam asas, angústia de dizer, e o corpo se agite, animal faminto. Tu permaneces, acima das horas e sobre os dias, como se horas e dias não houvesse, como se o tempo fosse um besouro preso nos meus cabelos e os teus dedos fossem a sua improvável salvação. Não me comove a chuva, ou a beleza do silêncio. Sou toda eu, um esgar contido, um pequeno frêmito da superfície onde nas profundezas desmoronam cada um dos meus degraus.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

No ínicio

No começo pensamos estar a salvo, avançamos com cuidado, saíremos incólumes, ou,  na pior sortes, ser-nos-á doce a morte, em caso de algum revés.
Depois, resignados, cientes dos possíveis estragos, mantemos os olhos apertados: Que seja o que deus quiser!
Por isso cada vez é um susto, por isso cada vez se faz silêncio, por isso há sempre um pequeno luto, em honra de nossa falta de senso.
Abrindo um vão, ou escancarando as portas. A intromissão é total, é completa.
Daí por diante nenhuma estante, a salvo da desordem. Nenhuma cortina, que não possa ser aberta.
Sim, sou um mamífero. Mas quem me dera ter conservado o meu lado predatório, que me faria tê-lo atacado e comido ali mesmo.

À procura de mim

Ando a pensar deitar-me fora. pegar em mim e sacudir-me até partir. Partir-me de propósito. Embrulhar os cacos e arrumar-me no fundo da cave. seria bom não precisar de mim por uns tempos!
Sei que devo encontrar-me antes de me deitar fora. parece-me lógico.
Se me conseguir encontrar, e é provável que leve algum tempo, não pretendo condenar-me. condenar-me a mim própria é inútil, o absolutamente eu não se altera.
Se um dia eu pensar que morri por me ter deitado fora, quando morrer de facto, ninguém vai reparar, não haverá notícia. e isso tranquiliza-me.
Deitar-me fora. porque não sou capaz de contemplar o que temo, nem aceitar o que me dá prazer mas que não presta.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

tolices concretas

A verdade, mais tola e mais simples, mais certa e mais secreta é que me fazes falta, esse vácuo, esse oco, sem precisão ou contorno, sem nome ou lógica. Tu faltas-me e fazes-me carregar uma ausência indefinível e perpétua, um esgar que é antes um tactear no vazio do que um estender de mão em direção a algo. Tu fazes-me falta, cavas-me um buraco, pões no meu rosto um borrão que não me desfigura, antes me torna um enigma para mim mesma. E tenho andado a tentar definir-me e a me reconfigur ao redor disto: da tua falta. Sou esta que se ressente da tua ausência sem saber sequer como é 'ainda' a tua presença, que forma tem o teu corpo, qual o cheiro do teu hálito, qual a cor dos teus olhos, que gosto tem a tua boca assim que despertas. E no entanto sei disso: fazes-me falta, essa falta ampla e completa que toma conta do dia cada vez que me vem à mente o teu nome, essa falta que abre uma brecha no tempo, que suspende os ruídos do mundo, que modifica a direção do vento e que toma da minha essência e eu faço de conta que sou uma outra, que eu invento para parecer que continuo a viver.

O Brilho da Sombra

A minha foto
“Estou certo de que estive aqui, como estou agora, mil vezes antes e espero retornar mil vezes... A alma do homem é como a água; vem do Céu e sobe para o Céu, para depois voltar à Terra, em um eterno ir e vir.” - Goethe -

Outras Sombras