Volto agora, e nomeio-me outra, nova, livre de tudo que é teu,
para finalmente deitar-me de novo a teu lado. Alva e leve, a esperar que me
invadas todas as frestas. Volto. Volto ao que não era, ao que foi um dia o
horizonte. E reivindico-me ao tempo, eu, feita de mim mesma. Torno-me louca e
santa, cega, oca, tomo-me de volta. Ressuscitada e renascida, para ser uma de
mim que não te conhece, uma de mim onde os teus pés não pisaram, uma de mim que
não conheceu a tua língua de prata, que não sabe de cór a côr dos teus olhos
cheios de noite, da dor da tua casa incendiada, do teu peito emborcado, da
solidão que anda pela tua pele.
Volto onde começou tudo, onde as lembranças ainda ardem,
onde o escuro permeia todos os instantes do dia, para poder ver-te antes ainda
de existires dentro dos meus olhos, para poder saber-te, ainda, antes de saber
da minha chegada, antes de me dares um nome. Um corpo nascido das tuas mãos,
antes que eu viva impregnada disso tudo, de nós.